A França é, no mundo, o país que mais recebe turistas estrangeiros e Jean-Phillippe Pérol, diretor do órgão oficial de fomento turístico Atout France/Maison de la France (http://france.fr), é um profissional reconhecido internacionalmente por sua atuação em prol desse sucesso.
Pérol ocupou o cargo de diretor-geral na sede da organização, em Paris, e, depois dos atentados terroristas nos EUA, foi estrategicamente enviado para Nova York, onde assumiu a diretoria da Atout France para as Américas.
Embora trabalhando no turismo oficial da França desde 1988, ele elegeu, afinal, a cidade de São Paulo para morar e, ao todo, o expert em turismo já morou no Brasil por 25 anos –sua mudança mais recente data de 2010.
Ele também foi diretor para as Américas da Atout France na Alemanha e na Polônia e tem no currículo atividades empresariais ligadas à indústria de viagens como dono da Safári Turismo de Manaus, na década de 1980; executivo da Air France; e diretor-geral da pioneira operadora multinacional Wagons Lits no Brasil e na França.
Leia a seguir trechos da entrevista exclusiva que Pérol concedeu à Folha falando do sucesso francês no turismo receptivo global, de problemas como os atentados terroristas e das lições que o Brasil poderia aproveitar.
O SEGREDO FRANCÊS
“A França é tradicionalmente o país que mais recebe turistas estrangeiros em todo o mundo e as razões são a excepcional mistura de belezas naturais e de heranças culturais que carregam valores que o mundo inteiro reconhece.
Vem depois as infra estruturas e os equipamentos publicos. Enfim não se pode esquecer a geografia que colocou a França perto de alguns dos maiores mercados emissores do mundo: Alemanha, Inglaterra, Itália, Holanda e Belgica.
O segredo é essa multiciplicade de forças que permita ter uma oferta completa: patrimônio, cultura, negócios, lazeres, praias, esqui, gastronomia, eventos, e até paraísos tropicais. A Franca é sem dúvida, junto com os EUA, o pas que tem o leque de opções mais completo em seu turismo.
O SUCESSO EM NÚMEROS
Em 2015, foram 85 milhões os turistas estrangeiros que visitaram a França, sendo os ingleses e os alemães os mais numerosos, seguidos pelos belgas, holandeses e italianos.
Em receitas, porém, os três mais importantes são os ingleses, os norte-americanos e os alemães.
De acordo com números consolidados que mostram o movimento global de turistas, a França recebeu 83,7 milhões de viajantes estrangeiros; depois vieram os EUA com quase 70 milhões; a seguir a Espanha, com cerca de 65 milhões; e, depois, a Itália, visitada por 48,6 milhões de turistas internacionais.
China e Turquia também mostraram grande crescimento e, em 2014, estima-se que tenham, respectivamente, recebido em torno de 67 milhões e 37,8 milhões de viajantes estrangeiros.
De todo modo, as grandes tendências do últimos anos são a subida dos EUA, que acontece mais vigorosamente desde o início da era Obama. Esse país já é o segundo no mundo em número de passageiros que para lá se destinam e, o que é impressionante, estão em primeiro disparados em no quesito receitas advindas da indústria do turismo.
Outra força, já mencionada, é a China –que, supostamente, pode até chegar em primeiro nesse ranking em 2020, ainda que o critério da contagem do número de visitantes estrangeiros feito por eles inclua cidadãos vindos de Hong Kong e de Macau como turistas internacionais.
OS EUA E A ESTRATÉGIA DOS CONCORRENTES
Quando me perguntam qual seria para a Atout France o grande “concorrente” no futuro, respondo que, especialmente no Brasil, os EUA são o maior concorrente.
É um país que tem uma oferta muito completa e diversificada, infrestruturas excepcionais, e que também tem uma imagem muito forte e que carrega valores universalmente reconhecidos.
Com a criação do Brand USA, na primeira gestão de Barack Obama, com seu modelo público-privado, os EUA passaram a ter um modelo de parceria que é muito parecido com o sistema que era adotado pela Maison de la France em 1987.
Sem dúvida, eles têm agora uma dinâmica promocional muito forte do seu turismo –e trabalham com recursos como só eles são capazes de reunir.
DESAFIOS PARA O FUTURO
Para continuar na liderança do turismo receptivo internacional, a França enfrenta agora vários desafios e concorrências.
O primeiro é renovar o seu parque hoteleiro e suas infraestruturas, especialmente fora dos grandes centros, inclusive aprimorando o serviço e atendendo às novas demandas dos consumidores.
O segundo é continuar a melhorar a sua imagem, guardando o fabuloso acervo dos seus valores – e até dos clichês – mas também renovando essa imagem.
É preciso mostrar que a cultura francesa está muito viva, é atual e, ao mesmo tempo, é preciso integrar as novas tendências.
Daria três exemplos –entre mil possíveis: a cultura porque o turistas vão à França procurando museus e monumentos, mas a França também tem um calendário de eventos, de exposicões e de shows tão grande que é comparável –ou até maior– aos de Londres e até aos de Nova York.
As compras, porque se pode comprar de tudo em Paris, não somente as grandes grifes de alta costura ou de perfumaria, mas eu diria que todas as coisas que os brasileiros vão comprar em Miami ou Nova York, de street wear a computadores e até roupas de bebê, também estão à venda na capital da França.
Isso para não falar dos vinhos, não somente dos grands crus caríssimos, mas também dos vinhos mais accessíveis, aqueles que devem em primeiro lugar acompanhar momentos de alegria e de descontração com amigos.
A nossa comunicação, quando falamos de promoção de turismo, tem que mostrar que somos atuais, acessíveis, e acolhedores. E somos!
MUITO ALÉM DE PARIS
Além de Paris, a França mostra sua vocação turística em Nice, Lourdes, Bordeaux, Marselha, Vale de Loire, Normandia, Champagne, País Basco, Alsácia.
Nossa meta hoje é, claramente, aumentar o número de visitantes nos grandes destinos turísticos, que são as ‘marcas’ que queremos valorizar.
Isso inclui as regiões ultramarinas como o Taiti, a Martinica, Guadalupe e até a Guiana –um território ultramarino da França que, aliás, faz fronteira com o Brasil.
Hoje, somente 15% dos brasileiros pernoitam nas regiões francesas e, por isso, queremos que o crescimento seja muito mais forte nos próximos anos.
O QUE ATRAI TURISTAS?
Se me questionam o que mais atrai visitantes à França, se é a cultura, a gastronomia, o enoturismo, as grandes ou pequenas cidades, eu respondo que 53% dos brasileiros estão bastante interessados em arte e em cultura.
Em seguida, vêm o turismo urbano –incluindo as compras e as descobertas pelas cidades–, e ainda a visita às atrações turísticas, que representam 52% da atratividade da França.
Por fim, de acordo com as pesquisas da Atout France, estão as belas paisagens e a natureza (46%), os patrimônios históricos e monumentos (41%) e a gastronomia (28%).
Comparada a outros destinos europeus, a França ainda é considerada um destino caro, mas, na realidade, as diárias de hotéis, por exemplo, são em média mais baratas que em outros países e cidades da Europa, caso de Londres e de Roma, principalmente quando se sai de Paris.
MERCADOS DISTANTES E NOVOS
O mercado asiático apresenta um crescimento forte no turismo francês, com grande participação, principalmente, dos chineses, que representam atualmente 1,7 milhões de turistas por ano na França –e deverá passar dos dois milhões até 2020.
Além da China, a Índia e o Sudeste Asiático também são regiões cujo número de turistas com destino à França vem crescendo nos últimos anos.
Já a presença dos japoneses diminuiu quase 40% nos últimos 20 anos, chegando a 600 mil turistas/ano atualmente.
Apesar da retração de cerca de 25% no ano passado devido à desvalorização do iene frente ao euro, e aos atentados terroristas, a França continua sendo o primeiro destino dos japoneses na Europa –e os números já apresentam uma certa recuperação.
O TURISTA BRASILEIRO
A França continua sendo o primeiro destino dos brasileiros na Europa.
Em 2015, 600 mil brasileiros visitaram a França e isso quer dizer mais da metade dos turistas vindos da América Latina.
E assim, apesar de um leve recuo de menos 9% em 2015 e de menos 5% estimados em 2016, a tendência estrutural é de crescimento.
Nosso objetivo é alcançar a marca de 1,5 milhão de brasileiros fazendo turismo na França em 2025.
A (DELICADA) QUESTÃO DA SEGURANÇA
Não se pode negar que o terrorismo é um probelma sério e que os ataques terroristas em Paris tiveram uma repercussão no turismo francês e que esses fatos lamentáveis atrapalham nosso desempenho.
No entanto, os brasileiros não foram a nacionalidade mais atingida pelo medo de nos visitar.
Houve um recuo estimado em 10% nos meses seguintes, mas já se nota uma recuperação.
Desde então, foram tomadas medidas convincentes e efetivas de segurança pública por parte das autoridades francesas com o objetivo de limitar o impacto negativo dos atentados frente aos turistas.
E continuamos em vigilância total.
MÍDIA ONLINE E BLOG PESSOAL
Na Atout France damos uma importância muito grande às novas mídias. Concentramos a maioria dos nossos investimentos na mídia online, sendo a mídia profissional a única exceção nas mídias tradicionais.
Um grande exemplo de nosso desejo de estarmos cada vez mais presentes nas novas mídias é a nossa página no Facebook, que já ultrapassou os 600 mil fãs no Brasil –50% do total mundial fora da China.
Damos uma grande importância aos bancos de dados e ao contato com esse público, que é privilegiado por nós.
Também promovemos nossos destinos por meio de sete ‘newsletters’ mensais, enviadas a mais de 2 milhões de seguidores. O mesmo acontece com os nossos maiores parceiros, caso do Taiti, que tem duas newsletters mensais e duas páginas no Facebook, uma português e outra em espanhol.
A vontade de acompanhar os profissionais e/ou os viajantes mais interessados pela França me levou a lançar um blog, “Le blog do Pérol ” (http://leblogdoperol.com).
Foi, na verdade, no início, uma idéia da minha esposa Caroline – e depois dos meus colegas – para dispor de uma plataforma de expressão onde eu poderia dividir minhas experiências e minhas opiniões sobre o turismo francês, dar algumas dicas, mas também destacar ideias sobre as evoluções do turismo internacional, o futuro dos circuitos de distribuições ou as novas tendências de produtos ou de destinos.
O blog também tem uma página no Facebook, que leva mesmo nome, chegando a quase 45.000 fãs, o que me deixa feliz e me faz supor que a minha fórmula está sendo aprovada.
O MERCADO E A INTERNET
Não podemos apenas ficar nos circuitos tradicionais, menos de 25% dos passageiros passam por esse tipo de circuito.
Acredito que, no futuro, os intermediários só conseguirão se sustentar se oferecerem algum valor agregado ao serviço proposto.
Por essa razão é fundamental que tenhamos uma presença multicanal e que trabalhemos tanto com uma plataforma, um receptivo, como também como canal de venda direta, oferecendo conhecimento sobre o nosso produto, para que eles possam criar esse valor agregado.
PREFERÊNCIAS E REFERÊNCIAS
Gosto de visitar lugares ‘où souffle l’Esprit’, ou seja, de destinos que misturam grandes belezas naturais e profundos conteúdos culturais e históricos.
Fora da França, vibro com Veneza, Istambul, Andaluzia e Síria. Adoro o México, a Ilha de Páscoa e a cidade de Jerusalém, mas o meus destinos preferidos são os peruanos Cuzco e Machu Pichu.
Já fui para lá cinco vezes, sendo a última para conhecer a trilha do Caminho Inca, uma experiência fabulosa.
Sou fascinado tanto pela beleza do local –os picos e os vales dessa região do Peru, onde nascem os rios amazônicos, quanto pelas obras impressionantes deixadas pelos incas e pelos seus colonizadores espanhóis.
AS PRÓXIMAS VIAGENS?
Logo vou para Lyon, a trabalho.
No Brasil, entre dos meus destinos favoritos, estão, é claro, Salvador, Rio de Janeiro e Foz do Iguaçu.
Mas, o meu destino predileto mesmo é a Amazônia, com o Festival de Parintins, a pescaria nos afluentes do rio Madeira ou no rio Negro, os passeios ecológicos nas Anavilhanas ou nas praias de areia branca do próprio rio Negro!”